Com certeza
Clotilde Tavares | 31 de agosto de 2009Nessa nossa época de muitos meios de comunicação, tudo se propaga com a maior rapidez. E, de repente, coisas estranhas e às vezes sem sentido ou sem fundamento passam a ser incorporadas ao nosso comportamento ou à nossa linguagem, sem que a gente saiba direito porque isso acontece. Não é culpa nossa, nem é porque somos colonizados, ou coisa que o valha. Isso se dá pelo imenso poder que têm os meios de comunicação de impregnar nossos sentidos, invadir nossa cabeça, e tal coisa acontece mesmo quando somos bem informados e temos consciência do processo. Avalie quem não toma consciência disso! Repete e macaqueia sem nem sequer saber o que está fazendo.
Quer ver? Pense nas coisas que a gente diz quando fala. Refiro-me às expressões que muitas vezes são puramente regionais, como o clássico “É ruim!”, que é a cara do carioca. O “É ruim!” fica absolutamente sem sentido quando pronunciado sem a entonação correta, que só o carioca “da gema” sabe dar. Então, um nordestino dizendo “É ruim!” é tão estranho quanto um carioca dizendo “Oxente!” Mas, e daí? A gente termina dizendo, mesmo com o sotaque errado, mesmo sem saber direito o sentido, porque a gente ouve na novela, e termina incorporando ao nosso falar.
Há também as expressões que substituem o pensamento. Tenho um amigo que tudo que a gente pergunta ele responde: “Sóóóóóóó…” “E aí, Fulano, vai à praia?” E ele: “Sóóóóóóó…” “Gostou da música nova da banda Tal?” E ele: “Sóóóóóóó…” O “Sóóóóóóó…” do meu amigo, assim com esse “óóóóóóó” comprido e acompanhado de um olhar enviezado e preguiçoso é como se o dispensasse de pensar na pergunta que está sendo feita, liberando seus neurônios para outras atividades que só ele sabe. Esse “Sóóóóóóó…” é mais ou menos igual ao “Hum-hum…” com o qual algumas pessoas respondem a tudo, quando não querem responder. Conheço muita gente que faz isso e tem horas em que eu perco a paciência e pergunto: “Hum-hum é sim ou não?” Pois é.
Mas, para mim, a praga das pragas é o famigerado “Com certeza”. Ora, minha gente! “Com certeza” quer dizer exatamente isso: com certeza. Você vai sábado para a festa? Com certeza. Ou seja, vou para a festa sim, é certo que eu vá. Mas hoje, usa-se o “Com certeza!” para tudo. Ligue a TV e veja as pessoas sendo entrevistadas nas ruas: “O que a senhora acha dos juros da casa própria?” “Com certeza. Os juros estão muito altos.” ou “Você vai fazer vestibular para qual curso?” “Com certeza, para o Curso de Medicina”, ou ainda “O que você acha da política com toda essa sujeira que está acontecendo?” “Com certeza. Acho que vou votar nulo no próximo ano.”
Uma praga, uma pobreza, uma simplificação burra da linguagem, um vírus que corrói nossa forma de expressão, nos tornando mais pobres verbalmente e atrofiando cada vez mais nossa capacidade de pensar. Com certeza.
Kkkk adorei o artigo.. com certeza perfeito! kkkk =D
Hum… não vou comentar. Você já disse tudo.
bjs